A cartomante

Se a gente fosse como a música do Liniker, que tudo de nós coubesse na malinha de mão do meu coração, causaria menos bagunça. Mas da última vez que eu fui embora, a bagagem de nós extrapolou e até hoje, cai, às cinco da tarde de um domingo, da minha cabeça. Pensava ter prendido bem forte. Deixou o lado da mulher dona de si todo descoberto. Mostrou uma criança sorrindo timidamente, contando como provou o sabor do amor numa castanha caramelizada entre os copos de licor. Vou aproveitar a pouca roupa e dizer que se pudesse arrancar você de mim, te mudaria pra um vaso, porque as tuas lembranças ainda enfeitam o meu dia. Agora é quase metade, mas pra mim, foi ontem que os fogos de artifício mostraram o arco-íris nos teus olhos, pra mim, foi ontem que a gente desligou o telefone pela última vez. De lá pra cá, além das músicas novas, apareceu uma velha, até simpática, que não te viu nas cartas dela. Do tempo que eu apostei com ela eu precisava tirar algum proveito. Percebi que se eu fosse demitida, já poderia ser cartomante. Que a fila de mulheres no sofá com suas pernas inquietas à espera de saber se são traídas com suas sobrinhas é enorme. Tu sabes que eu não tenho dom e nem acredito nele. Mas como não investi na psicologia e gosto de conversar, desde a nossa última conversa, não achei ninguém pra isso. Hoje a minha ansiedade não se cura mais com longos passeios de bike, ameniza um pouco quando escrevo e estou com um gosto de limão no meio da língua. Meu peito esquenta. O tempo riu tanto de mim esse ano que eu decidi rir junto. Li um jornal nas tuas reticências. Te liguei. Te contei tudo. Imagina se quando cortei as cartas eu pudesse escolher as ordens das coisas? Também seria desconcertante saber que a gente iria se reencontrar. Imagina se as energias escrevessem todas as histórias e fossem descansar? Nada mais procrastinador do que o destino. Agora tu não se mostra nem um pouco interessado em me ajudar a guardar tudo de nós. E se oferece como um baralho do qual eu arrumo a coluna pra poder manusear. Respiro toda boba em ouvir tua voz grossa me chamando de baby. Não que eu tivesse esquecido. Eu nunca te esqueci. Não sei do futuro e tenho raiva de quem sabe.


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